Decisão sobre distribuição de energia (Tust e Tusd) contraria entendimentos dos tribunais.
Após anos de discussão e orientação favorável do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a não inclusão das Tarifas de Uso do Sistema de Transmissão (Tust) e das Tarifas de Uso do Sistema de Distribuição (Tusd) na base de cálculo do ICMS incidente sobre energia elétrica, uma recente alteração no entendimento do tribunal trouxe à tona novamente a discussão sobre a segurança jurídica nas pautas tributárias no país.
“Por anos as duas turmas de direito público do STJ possuíam entendimento favorável a não incidência do imposto, que seguia o mesmo entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) encampado em diversos julgamentos, segundo o qual nas operações de energia elétrica o imposto incide exclusivamente sobre a energia consumida. A partir de uma decisão não unânime da Primeira Turma em 2017, inaugurou-se a divergência no Tribunal, que só foi solucionada agora a partir de uma virada jurisprudencial”, explica o advogado Cássio Vinícius H. S. da Rocha Mesquita, do escritório Elcio Reis Advogados Associados.
Apesar de se tratar de uma questão definitiva no âmbito do STJ, ainda há possibilidade de o STF reconhecer a não incidência das tarifas na base de cálculo do imposto.
Isso se deve ao fato de que, independentemente da discussão travada no STJ em 2022, a Lei Complementar 194 alterou a Lei Kandir, passando a prever expressamente a não incidência do ICMS sobre serviços de transmissão, distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica.
Estados temem perder receita com isenção da Tust e Tusd
No entanto, a eficácia dessa previsão legal foi suspensa por decisão do STF em sede de medida cautelar na ADI 7195. A referida ação de inconstitucionalidade pendente no Supremo foi resultado do receio dos governadores estaduais sobre os impactos que a alteração legislativa poderia causar nas receitas estaduais.
Porém, tal receito é abstrato e injustificado, e não poderia, se sobrepor à vontade popular manifesta na alteração legislativa, questão a ser definida pelo STF, na avaliação de juristas.
“Embora a decisão do STJ não represente um aumento direto nas contas de energia, uma vez que a discussão visava à exclusão da Tust e Tusd da base de cálculo do ICMS, perdeu-se uma valiosa oportunidade de contribuir para a redução da regressividade do sistema tributário brasileiro. A manutenção dessas tarifas na base de cálculo do imposto perpetua uma estrutura fiscal que onera desproporcionalmente as camadas menos favorecidas da sociedade, agravando a desigualdade e dificultando o acesso a um serviço essencial como a energia elétrica”, diz o advogado.
Decisão atinge todos os consumidores
A advogada Júlia Queiroga, do escritório Maia & Anjos Advogados, reforça que a decisão do STJ prevê que a Tust e a Tusd devem ser incluídas na base de cálculo do ICMS de energia elétrica, nas situações em que essas tarifas são lançadas na fatura de energia como um encargo a ser pago diretamente pelo consumidor final, seja o consumidor que pode escolher seu próprio fornecedor de energia, seja aquele que não tem essa opção.
“De acordo com o novo entendimento do STJ, seria viável eliminar os encargos das etapas intermediárias do sistema de fornecimento de energia elétrica apenas se o consumidor final pudesse adquirir o recurso diretamente das usinas geradoras, sem utilizar as redes interconectadas de transmissão e distribuição. Com a consolidação da tese repetitiva, a conclusão da Corte será aplicada aos demais recursos afetados pelo Tema 986, observada, entretanto, a modulação de efeitos”, comenta Júlia.
Amanda Domingos e Gercielda Cruz, ambas da Ecovis BSP, explicam que, apesar de a energia ser um bem intangível dentro do conceito de mercadoria sobre o qual o ICMS incide, um dos principais pontos discutidos é a integração dos custos de transmissão e distribuição de energia na operação.
Essa divergência de entendimento tem sido uma questão entre estados e governo há anos, especialmente devido à falta de adaptação da legislação para abordar essa situação.
Fonte: Gilmara Santos, especial para o Monitor Mercantil